O NOVO REGIME LEGAL SOBRE
A POLUIÇÃO SONORA (RGR)
UM PASSO EM FRENTE OU UMA OPORTUNIDADE
PERDIDA?
A. P. Oliveira de Carvalho
Engº Civil, Ph.D., membro sénior da O.E.
Professor Associado FEUP
(in INGENIUM ed. Fevereiro 2001)
Foi publicado em Diário
da República a 14 de Novembro de 2000 o texto do novo Regulamento
Geral do Ruído (RGR) agora oficialmente denominado como REGIME
LEGAL SOBRE A POLUIÇÃO SONORA. O regulamento ainda
em vigor data de 24 de Junho de 1987 e embora aí fosse referido
(artº 2º DL 251/87) que seria revisto decorrido o prazo de
3 anos contado da data da sua entrada em vigor (sic) tivemos
de esperar mais de 13 anos para esta nova versão. Mas terá
valido a pena a espera? Vejamos os pontos mais marcantes desse regulamento
que entrará em vigor (embora parcialmente) em meados do corrente
ano de 2001.
Os elementos positivos
mais salientes do novo articulado podem sistematizar-se nos seguintes pontos:
-
A obrigação da existência de projecto acústico
a ser junto com os restantes projectos de especialidade em foro de licenciamento
urbano pelas câmaras municipais (artº 5 pt 4 b);
-
O aumento da exigência de conforto ambiental face a situações
de incomodidade sonora;
-
A inclusão e individualização das situações
de ruídos de vizinhança (de origem humana ou animal) (artº
10º);
-
A criação da licença especial de ruído
(artº 9º pt. 3);
-
Os controles preventivos e a possibilidade de aplicar cauções
de ruído;
-
A existência de coima (de 250 a 9.000 c.) para algumas situações
muito correntes no passado recente como a abertura de estabelecimentos
sem licença ou o incumprimento de ordens de encerramento;
-
A existência, agora clara e expressamente prevista no texto (artº
23º), do alargamento da possibilidade de aplicação de
sanções
acessórias tais como:
-
perdas de máquinas/utensílios;
-
privação do direito a subsídios ou benefícios;
-
suspensão de licenças ou alvarás;
-
interdição do exercício da profissão.
-
A inclusão de ensaios sonoros na inspecção periódica
de veículos (artº 16º pt. 3) falta porém saber
como irão os centros de inspecção realizar esses ensaios
no meio da ruidosidade habitual provocada por vários ensaios a decorrer
em simultâneo].
Porém existem
alguns pontos menos conseguidos, quer na índole da filosofia
de abordagem, quer na sua própria aplicabilidade técnica.
Um
ponto negativo de carácter genérico refere-se às sanções
pecuniárias previstas.
Uma
legislação tão radical como esta se afigura e tão
incisiva perante algumas actividades de origem social humana tem de ter
um efeito claramente dissuasor para obrigar à generalização
da sua aplicação.
Não
se compreende que algumas das infracções sejam agora sancionadas
com coimas de valor inferior (em termos reais ou mesmos em termos absolutos)
àquelas que existiam no texto de 1987.
Convém
notar que a inflação nesse período (Jun. 1987 a Nov.
2000) foi de cerca de 140% (e por exemplo o salário mínimo
de 1987 a 2000 subiu 153%).
O Quadro nº 1 apresenta alguns casos. Aí
pode verificar-se que, por exemplo, as possíveis infracções
às características técnicas de isolamento sonoro de
habitações viram reduzidas a sanções pecuniárias
a aplicar. Porquê?
Também não se compreende, que uma
infracção cometida por exemplo por uma discoteca poluidora
seja penalizada em 2001 por valores não superiores (em termos reais)
aos que eram preconizados em 1987 (atendendo à inflação).
E se soubermos que grande parte das coimas são aplicadas pelo seu
valor mínimo, que poder de dissuasão pode ter uma sanção
de 100.000$ ou mesmo 250.000$ para uma discoteca ou para uma fábrica,
muitas vezes após anos de poluição sonora?
Quadro 1 - Comparação entre alguns dos valores de coimas
previstos nas duas versões do Regulamento Geral do Ruído
(RGR).
TEMA
|
R.G.R. (Jun. 1987)
|
R.G.R. (Nov. 2000)
|
Edifícios (características
técnicas: isolamentos, etc.)
|
1.500 c. a 6.000 c.
|
100 c. a 5.000 c.
|
Implantação
de edifícios (habitações, escolas, hospitais) em zona
ilegal
|
1.500 c. a 6.000 c.
|
250 c. a 9.000 c.
|
Incomodidade sonora (para
o exterior ou terceiros)
|
50 c. a 1.000 c.
|
100 c. a 5.000 c.
|
Este novo RGR orienta muita
da sua filosofia base de aplicação para uma intervenção
forte e participativa dos órgãos autárquicos concelhios.
Nomeadamente remete para as câmaras municipais, por exemplo (listagem
não exaustiva):
- promover
a elaboração de mapas de ruído (artº 4º
pt 5);
[Mas
qual a metodologia normalizada a seguir por todos os municípios
portugueses na execução dos seus mapas de ruído? Não
basta seguir a normalização internacional pois essa não
passa de genéricas normas de boa conduta.]
- executar
relatórios sobre o estado do ambiente acústico (a apresentar
às respectivas assembleias municipais de 2 em 2 anos) (artº
7º pt 2);
- executar
planos municipais de redução de ruído (a aprovar pela
respectiva assembleia municipal) (artº 6º);
- licenciar
obras de construção civil mediante apresentação
dos elementos justificativos da conformidade com o presente diploma
(sic) e nomeadamente o projecto acústico que é obrigatório.
[Falta
porém saber quais os técnicos com competência legal
para executar e assinar esses projectos.]
E tal
como em grande parte da legislação entre nós, existe
sempre uma porta aberta para não serem tomadas as medidas exigidas,
pela figura do deferimento tácito.
No artigo 5º pt. 6 é referido que a ausência de parecer
no prazo de 20 dias entende-se como parecer favorável. Qualquer
câmara municipal pode assim não exigir o exigível.
É o governo central a claramente autorizar
a desresponsabilização dos órgãos do Estado
de nível concelhio. Faz-se a lei (adequada e correcta) mas
logo no mesmo instante se indica a forma de a não aplicar (e sem
ser sancionado por isso).
Notar que pelo articulado
da legislação o projecto acústico pode ser
apresentado como um Certificado de Conformidade
Acústica (de empresa acreditada na área do ambiente).
Não se refere contudo que tipo de documento é esse nem que
tipo de responsabilidade civil ou outra, é transferida para essa
entidade pelo eventual não cumprimento técnico do documento.
Se, em abstracto, tal aumento
de responsabilidade para as câmaras municipais poderia ser positivo,
surgem porém na concretização prática, muitas
dúvidas à eficácia desses novos requisitos.
Será
que as câmaras municipais estão minimamente preparadas para
essas novas tarefas? Terão elas os meios materiais, humanos
e financeiros para este acréscimo de trabalho de carácter
técnico específico muito vincado? Parece evidente que não
e a própria Associação Nacional de Municípios
Portugueses (ANMP) já foi porta-voz deste facto. Talvez à
excepção de um reduzido grupo de câmaras municipais,
a grande maioria das 308 câmaras irá certamente ignorar este
regulamento (como ignorou o anterior RGR) e usar, pelo menos por agora,
a eficaz e legal figura do deferimento tácito.
E em termo de custos? Por
elementos divulgados pela União Europeia prevê-se que o custo
só do mapeamento do ruído possa atingir até cerca
de 400$/habitante. Os planos de acção/redução
de ruído poderão custar um valor idêntico. As acções
colaterais de fiscalização/divulgação/etc.
poderão ainda acrescer em idêntico valor. Teríamos
assim um custo de até 1.200$/habitante o que daria um custo
global de até 12 milhões de contos para todo o País.
E
não contabilizamos ainda os custos correntes anuais de gestão
e aplicação de todo este novo processo, directa ou indirectamente
envolvido com as novas responsabilidades camarárias nesta área
que poderão ser da ordem dos 3-5 milhões de contos/ano.
E em que intervalo de tempo?
O
RGR não define claramente um limite temporal para essas tarefas
mais básicas. Pode talvez assumir-se que seja para entrar
em vigor com o início da validade do diploma (meados de 2001). Contudo
a própria União Europeia preconiza na proposta de Directiva
(já em fase final de aprovação) [1]
um prazo até 2005 para o mapeamento do ruído de grandes aglomerados
populacionais (superior a 250.000 habitantes) e até 2010 para os
aglomerados menores e até 100.000 habitantes. Os planos de acção
serão devidos até 1 ano após os prazos acima referidos.
O novo RGR é omisso em relação a datas e prazos neste
aspecto particular.
Outro ponto de análise
não totalmente feliz é o respeitante ao ruído provocado
por tráfego aéreo (artº 17º novo RGR). Aí
se estabelece que ficarão proibidas (embora só a partir de
Maio de 2002) as aterragens ou descolagens entre as 0 e as 6 h. Este seria
um facto muito positivo não fora a existência de excepções,
tais como:
-
se os aviões não forem civis
[mesmo em qualquer circunstância? Porquê?];
-
se houver um sistema de monitorização de ruído
[será que basta comprar um sonómetro e fazer
umas medições para se poder provocar ruído? As populações
serão menos susceptíveis ao incómodo sonoro se souberem
que o aeroporto tem um sonómetro no terraço?];
-
se por motivo de força maior
[esta frase é muito abrangente e permite autorizar tudo
- será isso que se pretende? O lógico e razoável seria
usar uma terminologia do tipo "por motivos de emergência"].
Como já outros referiram,
é sempre
por via das excepções nos textos legislativos que, entre
nós se dissimulam as cedências...
O
novo RGR enferma também de uma incoerência. Esse texto
revoga todo o articulado do anterior RGR excepto os seus artigos 6º
a 9º. Ora, talvez por lapso, esqueceu-se o legislador que ao revogar
o artigo 4º do antigo RGR (classificação de locais)
impede a utilização do seu artigo 6º pt. 1 (limite do
R45
em habitações em função da classificação
dos locais) que se mantém em vigor.
Segundo o novo RGR (artº
5º pt.s 7 e 11 e artº 20º pt. 4) a realização
de ensaios, inspecções, o apoio técnico ou mesmo a
emissão de certificados de conformidade acústica pode ser
feito por entidade acreditada para a área do ambiente e que exerça
a sua actividade no domínio do ruído (sic). Isto quer
simplesmente dizer que uma empresa acreditada para ensaios ao ar, à
água ou com qualquer outra actividade remotamente ligada ao ambiente
pode intervir sobre o ruído.
Utilizando
uma simbologia comparativa, seria o mesmo que preconizar que as análises
clínicas para despistagem de doenças infecto-contagiosas
poderiam ser efectuadas por "qualquer entidade ligada à saúde"
(isto é, desde postos de enfermagem, farmácias, ervanárias,
empresas de aluguer de ambulâncias, etc.).
Parece
de elementar justiça que para credibilizar a administração
pública esta só aceite relatórios e intervenções
na área do ruído de entidades acreditadas para ensaios especificamente
nesta área e não de colaterais. Actualmente existem
já em Portugal 13 entidades acreditadas para ensaios na área
do ruído e, com essa obrigatoriedade expressa na legislação,
outras mais rapidamente surgiriam a requerer essa inevitável e necessária
acreditação.
Um dos pontos mais utilizados
do anterior RGR refere-se ao expresso nos artºs 14º/20º
que limitava a 10 dB(A) o acréscimo de ruído que qualquer
actividade poderia provocar para o seu exterior. Isto é, o "lixo
sonoro" como subproduto de uma actividade não podia exceder os 10
dB(A). Isso era determinado através da análise da diferença
entre o LAeq (nível sonoro contínuo equivalente)
do
ruído particular corrigido e o LA95
(nível sonoro excedido em 95% do tempo de medição)
do ruído de fundo. Esse limite era de facto um valor excessivo
e só era compreensível como tendo sido uma primeira abordagem
à situação que vigoraria unicamente por 3 anos. A
lei tinha pois um carácter muito permissivo que importava rapidamente
alterar. Tal foi feito baixando esse valor de 10 dB(A) para 3 ou 5 dB(A)
em função do período do dia (embora podendo atingir
os 9 dBA em casos particulares em função do tempo de emergência
do ruído).
Convém esclarecer que os valores limites do anterior RGR e do novo
RGR não são imediatamente comparáveis pois os parâmetros
de análise são ligeiramente diferentes. Agora passa-se a
usar o LAeq em vez do LA95 do ruído
de fundo.
Se uma redução desse valor de 10 dB(A) era desejável,
ser-se tão "ecologicamente radical" é contraproducente. Exigir-se
um máximo de 3 dB(A) para situações de ruído
nocturno é tornar imediatamente ilegal a quase totalidade das situações
de actual contiguidade nefasta, tornando assim ineficaz a existência
de legislação.
Se actualmente mesmo o limite permissivo dos 10 dB(A) não
era de fácil e eficaz aplicação não é
credível admitir como possível a institucionalização
rápida desse abaixamento radical, para os 3 dB(A). Dever-se-ia talvez
reduzir inicialmente durante 4 ou 5 anos para, por exemplo, 6 dB(A) e depois,
mais tarde, para 4 dB(A) por mais igual período, se as condições
sociais o justificassem, e só então atingir-se o rigor dos
3 dB(A).
Uma questão técnica
relevante neste aspecto prende-se com a alteração do parâmetro
de análise do ruído de fundo do estatístico LA95
para o energético LAeq. Se a mudança parece
tecnicamente correcta pois permite comparar grandezas idênticas embora
em situações ambientais distintas, em termos práticos
a situação altera-se.
A determinação prática in situ do LA95
(ruído de fundo) é relativamente fácil e rápida
pois existe uma convergência habitualmente muito célere dos
valores rastreados. Com o uso do parâmetro
LAeq
tal situação altera-se quase por completo.
A determinação do LAeq por exemplo durante
2 horas (e já é um período de análise muito
alargado e hoje pouco corrente em foro de acções de fiscalização)
das 22 h às 24 h daria, na maioria das situações,
um valor numérico muito distinto do que se medido, por exemplo,
das 3 às 5 horas da noite. Por isso, qualquer resultado dessas medições
irá depender fortemente da escolha do intervalo de medição
e da sua duração e será assim facilmente contestável
por uma das partes envolvidas no conflito. O rigor de análise e
a credibilidade exigível aos resultados passará então
a impor quase obrigatoriamente medições em intervalos de
tempo muito alargados (em muitos casos até 4 ou mais horas) o que
tornará impraticável a grande maioria das situações
de fiscalização. Será então relativamente fácil
contestar a validade de quase qualquer acção ou coima baseada
na determinação desse parâmetro.
Outro ponto menos conseguido centra-se na ausência
de alterações do RGR para as características técnicas
dos edifícios pois os artigos 6º a 9º do antigo
RGR mantêm-se em vigor. E são esses os únicos que definem
os valores limite relativos ao isolamento sonoro e outras características
da envolvente de edifícios de habitação, escolas e
hospitais.
Será que faltou a coragem ou vontade para actuar neste aspecto que
é aquele que directamente interfere com a qualidade ambiental dos
edifícios mais importantes para todos nós? Continua assim
hoje a exigir-se o mesmo que há 14 anos atrás.
-
Continua assim a impor-se, por exemplo, que o isolamento sonoro mínimo
entre uma discoteca e uma habitação seja o mesmo que entre
uma loja de fazendas e uma habitação.
-
Continua a não se exigir qualquer característica acústica
especial aos edifícios destinados a tribunais ou a outras repartições
públicas onde o ambiente sonoro é, muitas vezes, francamente
prejudicial às tarefas aí desenvolvidas.
-
Continua a não ser limitado o ruído provocado no interior
de edifícios de habitação por equipamentos mecânicos
nele instalados (por exemplo, elevadores, portas de garagem, sistemas de
ventilação interior, etc.).
Convém
referir que a prática corrente na aplicação esses
artigos 6º a 9º (anterior RGR) era infelizmente quase nula. Pura
e simplesmente a quase totalidade das câmaras municipais não
exigia nenhum projecto acústico no licenciamento. Por exemplo, as
escolas construídas pelo Estado continuam quase a ignorar o RGR.
O
RGR nos seus artigos 6º a 9º era , todos o sabemos, quase letra
morta. Talvez por isso o legislador decidiu não lhe mexer.
Talvez sem coragem para mudar pois parece nunca ter tido vontade para a
fazer aplicar.
Temos
assim hoje alunos a estudar em salas de aula que prejudicam gravemente
a aprendizagem por apresentarem tempos de reverberação elevadíssimos
ou fracos isolamentos sonoros face ao exterior ou reduzidos isolamentos
sonoros entre salas, etc.
Nesta área dos Edifícios,
este novo RGR deveria ter, pelo menos, corrigido as denominações
dos parâmetros que, por força da normalização
europeia, foram instituídas nesta área específica.
Continuamos a ter na lei por exemplo os Ia e os Ip quando
na actualidade devíamos já utilizar outras denominações
(neste caso, Dn,w e L'n,w). Porém, não podemos
pois um decreto-lei tem mais força legal do que documentos normativos
(mesmo se europeus). E este assunto não é tão
insignificante como poderia parecer pois as normas das metodologias de
determinação e cálculo desses parâmetros (as
NP 669 e NP 2073) foram também alteradas por publicações
de normas europeias (com base nas ISO 140 e ISO 717) que se sobrepõem
às portuguesas por força dos acordos de adesão à
União Europeia. O uso dessas novas normas (que revogaram as
anteriores NP's), devido às pequenas alterações que
apresentam, podem nalgumas situações conduzir a resultados
um pouco diferentes, o que se poderia e deveria ter tido o cuidado de acautelar.
Um outro
ponto de carácter técnico que se encontra incorrecto no articulado
do novo RGR refere-se à caracterização do ruído
tonal
(novo RGR Anexo I - pt 1). Aí é referido que o método
para detectar as características tonais do ruído consiste
em
verificar, no espectro de um terço de oitava, se o nível
de uma banda excede o das adjacentes em 5 dB ou mais (sic). Esquece-se
porém o legislador de limitar em frequência essa análise.
Essa falha é bastante grave pois permite considerar ou não
como tonal um ruído e assim aplicar-lhe uma elevadíssima
penalização que pode, só por si, tornar ilegal a situação.
Por exemplo, poderá ser considerado tonal um ruído
com uma componente na banda dos 50 Hz, 5 dB superior às suas bandas
adjacentes dos 40 e 63 Hz? Embora subjectivamente e cientificamente esse
ruído não seja tonal, o articulado do texto do RGR fá-lo
considerar como tal. É cientificamente reconhecido que o diferencial
de 5 dB em bandas adjacentes como limite mínimo para a constatação
da "tonalidade" de um ruído só é tecnicamente aceitável
se se referir a bandas de frequência superior ou igual a 400 Hz.
Para bandas de frequência inferiores e até cerca dos 160 Hz
esse diferencial para atribuição da tonalidade deverá
aumentar para cerca de 8 a 10 dB. Para bandas de frequência ainda
mais baixas a "tonalidade" de um ruído só poderá ser
atribuída para diferenciais das bandas adjacentes superiores de
10 a 15 dB (ver por exemplo [2, 3]).
Outro ponto incompreensível
é que este novo RGR parece esquecer completamente o trabalho da
União Europeia nesta área que tem já preparada e aprovada
uma proposta de Directiva Comunitária [1]
sobre este assunto. O novo RGR não utiliza esse documento pois infringe
alguns dos seus pontos mais básicos como, por exemplo :
- Usa 2 períodos
de referência quando a proposta de directiva preconiza o uso de 3;
-
Usa o parâmetro LAeq quando essa proposta de directiva
se refere unicamente aos LDEN e LNight.
-
Não se articula com os largos prazos de implementação
previstos (com acções até ao ano de 2011).
Este novo RGR apresenta
alta exigência de conforto ambiental o que é de louvar. Contudo,
afigura-se de aplicação muito difícil
ou problemática e de fraco ou nenhum poder de dissuasão.
Qualquer
legislação só pode ser considerada adequada se for
útil, eficaz, exequível e tiver suficiente poder de dissuasão
face a possíveis incumprimentos. Esta lei
não consegue pois atingir os objectivos sociais e técnicos
a que se propõe. Mais parece ser uma legislação
que se destina não a ser efectivamente aplicada entre nós
mas tão somente para exteriorizar que Portugal está muito
avançado no combate ao ruído.
Com
o estilo e prática da grande maioria dos intervenientes neste domínio,
o novo RGR será amplamente ignorado por impraticável. Já
vários organismos compreenderam isso e publicamente o afirmaram
como a ANMP e a QUERCUS.
"Ao
legislador exibicionista pouco lhe interessa saber se as leis que aprova
são exequíveis e têm os meios de ser postas em prática"
(António
Barreto in Público 24.09.2000).
[2]
Environmental
Noise Measurement, Brüel & Kjaer, BR 0139-12, Lyngby (Dinamarca);
[3]
NF S 31-010, Acoustique, caractérisation et mesurage des bruits
de l'environment, Paris, Dez. 1996.